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MÁRIO DE SÁ CARNEIRO
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Devido ao seu temperamento, adere, sobretudo, ao simbolismo.
Por isso, e da mesma forma que Verlaine proclama,
“de la musique avant toute chose”,
encontramos na poesia de Sá Carneiro a anarquia das regras
e a excentricidade temática
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Mário de Sá Carneiro, por Almada
O doce beijo de mãe
Entre as damas o beijo é praxe estab’lecida,
MONÓLOGO
BEIJOS
«Beijar!» linda palavra!... Um verbo regular
Que é muito irregular
Nos tempos e nos modos...
Conheço tanto beijo e tão dif'rentes todos!...
Conheço tanto beijo e tão dif'rentes todos!...
Um beijo pode ser amor ou amizade
Ou mera cortesia,
E muita vez até, dizê-lo é crueldade
É só hipocrisia.
O doce beijo de mãe
É o mais nobre dos beijos,
Não é beijo de desejos,
Valor maior ele tem:
É o beijo cuja fragrância
Nos faz secar na infância
Muita lágrima... feliz;
Na vida esse beijo puro
É o refúgio seguro
Onde é f'liz o infeliz.
Entre as damas o beijo é praxe estab’lecida,
Cumprimento banal – ridículos da vida!
–:(Imitando o encontro de 2 senhoras na rua)
– Como passou, está bem? (Um beijo.) O seu marido?
(Mais beijos.) – De saúde. E o seu, Dona Mafalda?
– Agora menos mal. Faz um calor que escalda,
Não acha? – Ai Jesus! que tempo aborrecido!...
Beijos dados assim, já um poeta o disse,
Beijos perdidos são.
(Perder beijos! que tolice!
Porque é que a mim os não dão?)
O osculum pacis dos cardeais
É outro beijo de civ’lidade;
Beijos paternos ou fraternais
São castos beijos, só amizade.
As flores também se beijam
Em beijos incandescidos,
Muito embora se não vejam
Os ternos beijos das flores.
Há outros beijos perdidos:
Aqui mesmo,
Há aqueles que os atores
Dão a esmo,
Dão a esmo e a granel...
Porque lhes marca o papel.
– Mas o beijo d’amor?
Sossegue o espectador,
Não fica no tinteiro;
Guardei-o para o fim por ser o «verdadeiro».
Com ele agora arremeto
E como é o principal,
Vai apanhar um soneto
Magistral:
Um beijo d’amor é delicioso instante
Que vale muito mais do que um milhão de vidas,
É bálsamo que sara as mais cruéis feridas,
É turbilhão de fogo, é espasmo delirante!
Não é um beijo puro. É beijo estonteante,
Pecado que abre o céu às almas doloridas.
Ah! Como é bom pecar co’as bocas confundidas
Num desejo brutal da carne palpitante!
Os lábios sensuais duma mulher amada
Dão vida e dão calor. É vida desgraçada
A do feliz que nunca um beijo neles deu;
É vida venturosa a vida de tortura
Daquele que co’a boca unida à boca impura
Da sua amante qu’rida, amou, penou, morreu.
(Pausa – Mudando de tom)
Desejava terminar
A beijar a minha amada,
Mas como não tenho amada,
(A uma espectadora)
Vossência é que vai pagar...
Não se zangue. A sua face
Consinta que eu vá beijar...
......................... (atira-lhe um beijo)
Um beijo pede-se e dá-se,
Não vale a pena corar...
.[Mário de Sá Carneiro]
in Monólogo
Mário de Sá
Carneiro nasceu em Lisboa no ano de 1890.Frequentou o curso de Direito em
Coimbra (1911-1912) mas, desiludido partiu para Paris, para continuar os
estudos.Porém, preferiu a vida boémia dos
espectáculos, das ruas e dos cafés (o parisiense Café de la Paix, de que Sá
Carneiro era cliente, tem desde 1900 uma placa evocativa do poeta).Na capital francesa, a que chamou “cidade da minha ternura” cultivou uma vida singular, valendo-se da
protecção paterna e ligando-se a uma rapariga de rua, Heléne. Em 1916, a viver
no Hotel de Nice (Montmartre, Paris), suicidou-se com cinco frascos de
estricnina tendo convidado um amigo seu, José de Araújo, para lhe assistir à
agonia.
Montmartre
Fernando Pessoa, com quem Sá
Carneiro mantinha uma forte amizade, desde 1912, escreveu:“Génio na arte, não teve Sá
Carneiro nem alegria nem felicidade nesta vida. Só a arte, que fez ou que
sentiu, por instantes o turbou de consolação. São assim os que os Deuses fadaram
seus. Nem o amor os quer, nem a esperança os busca, nem a glória os acolhe. Ou
morrem jovens, ou a si mesmos sobrevivem, incolas da incompreensão ou da
indiferença. Este morreu jovem, porque os Deuses lhe tiveram muito
amor.”Segundo Fernando Pessoa, Mário de
Sá Carneiro, teve uma vida miserável, dedicada à arte e preso ao facto de ser um
génio.Era adorado pelos Deuses, e por
isso sofria neste mundo de humanos.Sá Carneiro era mais do que
humano, era um ser dotado de sensibilidade e inteligência.Vivia aliado deste mundo, agarrado
às suas verdades que todos nós temos por mentira.Era um inovador no seu tempo e
sofreu na sua grandeza como se não conseguisse gritar toda a sua sabedoria e
tivesse morrido sufocado nela.Segundo Pessoa, Sá Carneiro viveu
num tempo em que qualquer privilégio era um castigo:
“Nada nasce grande que não nasça amaldiçoado,
nem cresce de nobre que não se definhe, crescendo…
Se assim é, assim seja!
Os Deuses o quiseram assim.”
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54 comentários:
Excelente dissertação poética de Mário de Sá Carneiro sobre o beijo...
Beijo simbólico de amizade, amor, cortesia e até traição.
Uso banal de um gesto que somente de afeição devia ser feito!
Para ti querida amiga envio um beijo verdadeiro, amigo e solidário.
Maria Faia
Ora aqui está um post excelente, sem mais palavras.
Acrescentar algo mais seria quase "pecado", as palavras estão lá todas...
Beijinho, Meg
Não conhecia este poema de Mário de Sá carneiro
Tão verdadeiro!
e meg vá ver o desfio, é quase feito para si, se não gostar, não faz.
beijo, com admiração por si.
Espectacular este post Meg!
Não conhecia este poema de Mário Sá Carneiro...ah...mas é excelente... esta dissertação sobre o beijo a quem, tanta gente dá tão pouco valor...
Deixo-te um beijo de amizade, mas daquela verdadeira, pois como sabes... eu não sou de fazer fretes...
MEG
Há aqui muito material e todo ele excelente.
Mário de Sá Carneiro foi um grande escritor e um homem marcado pelo próprio génio que se expande na emoção sofrida.
A loucura entre o prazer e a dor é uma fonte de inspiração tamanha que nem sempre traz a solução da vida.
Fernando Pessoa soube-o bem. O seu percurso de bipolar transformou-o num génio.
Abraço
Meg.
Gostei do deste excelente post de Mário Sá Carneiro,onde o beijo é simbolismo do amor e amizade.
Beijinho Lisa
De Mário de Sá Carneiro, gosto imenso do seu poema "Quase":
(...)
Um pouco mais de sol - eu era brasa.
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa ...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
(...)
Quase o amor, quase o triunfo e a chama.
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
(...)
Maria Faia,
De Mário Sá Carneiro haveria muito mais para dizer, mas para a semana julgo que se vai falar mais dele.
Ainda bem que gostaste.
Um abraço
Maria,
obrigada pelas tuas palavras mas realmente de M.S.Carneiro, apesar de ter morrido tão cedo, muito haveria a dizer.
Obrigada e um abraço para ti
Minucha,
É verdade, este monólogo não é das
peças mais conhecidas do Mário de Sá Carneiro.
Por isso o trouxe.
Quanto ao desafio já lá fui, Minucha. Muito Obrigado
Um abraço
Carminda,
É verdade o que diz o poema.
E o que falta dizer de Mário de Sá Carneiro daria para muitos posts.
Obrigada pelas tuas palavras.
E claro que só vale o que +e verdadeiro!
Um abraço
Silêncio Culpado
Lídia, para quem viveu 26 anos, tanto havia para dizer ainda, mas num post, é impossível.
Como se aproxima a data da sua morte, estou convencida que muito se irá falar de Mário de Sá Carneiro.
Muito obrigada pelas palavras e deixo-lhe um abraço
Agulheta
Lisa, como vês um simples gesto pode ter interpretações tão diferentes como as que Mário Sá Carneiro nos mostra aqui!
Um abraço para ti.
Boa escolha Amiga. Uma bonita homenagem a um grande Homem das Letras.
Kiss e Boa Semana
Ludo Rex
Ludo, o Mário de Sá Carneiro, merece, e espero que daqui a uma semana se volte a falar dele, que merece.
Um braço
Minha cara MEG
Não vale a pena tentar talhar o destino porque ele já nasce talhado.
Um abraço
Extraordinário poeta com uma vida tão breve.
Como sempre um óptimo post.
Grande abraço.
Peter,
Ficaste para trás, perdi-me na ordem dos comentários, mas achei-te agora.Pelo lapso, as minhas desculpas.
Quanto ao poema, o que pretendi foi precisamente mostrar este monólogo muito pouco conhecido.
Como se aproxima a data da morte, creio que Mário de Sá Carneiro
será lembrado.
Para tão pouco tempo de vida, tanta vida para contar, tanta obra para divulgar.
Um abraço
Meu caro Chanesco.
Parece que cada vez mais se confirma, não é?
Muitas vezes esquecemo-nos
Um abraço
Bípede Implume
É verdade. E é pena que não apareça mais publicado, não é?
Obrigada pelas tuas palavras.
Um abraço
Meg
Mais um poeta nem sempre bem amado. A sua poesia é mesmo desconcertante.
Bela escolha a deste poema.
Abraço
Um génio, que infelizmente partiu antes de tempo... Louco?! Seguramente que não...
Parabéns por recordá-lo aqui.
Xi Grande
Cara Meg
Eu a pensar em Sá-Carneiro e dou de caras com esta brincadeira de mau gosto, aqui colocada no comentário anterior a mim!
Faz, exactamente hoje, 100 anos, que Mário de Sá-Carneiro escreveu o seu "Quase", poema que alguém já referiu antes de mim. É um "quase" que se lhe cola à pele, tamanha era a promessa, "quase" deixada incumprida. Lê-se Sá-Carneiro de fio a pavio e fica-se com a boca a saber a pouco, porque se quer mais, porque ele prometia mais, porque ele era capaz de muito mais.
No poema que aqui publicou podemos constatar a que nível se elevava a promessa: a crítica, a ironia fina, mas também o lirismo puro e a prova de que é capaz de fazer segundo as regras (aquele soneto intoduzido a meio é primoroso), servindo-se delas para mostrar que as quebra porque é superiormente capaz e não aceita algemas.
Os futuristas portugueses são os únicos que me deleitam, quando quase todos os outros me irritam. Sá-Carneiro bem merece a homenagem que lhe fez trazendo-o aqui. Creio que, lá para 2016, lhe será feita a merecida homenagem nacional.
Um abraço
Cara MPS,
A brincadeira tem bom remédio, daqui a uns instantes vai para o espaço.
QUando ao mais importante, que é o Sá Carneiro, eu estive para publicar o Quase mas depois, como penso que ainda é dos mais divulgados e gosto deste...nesta altura foi o escolhido.
E como penso que dentro de dias, no aniversário da sua morte talvez apareça mais obra de Sá Carneiro - é impressionante tanto que nos deixou em apenas 26 anos de vida.
E sem trazer à lide o Fernando Pessoa... ficaria aqui a escrever toda a noite.
Mas vamos aos poucos, para as pessoas também terem tempo para outras leituras, que não estou cá sozinha.
Querida MPS,muito obrigada pela
sua visita...
E um grande abraço
CAro amaral,
E que deixou uma obra tão marcada, apesar de ter morrido tão cedo.
Um abraço
Amiga Porca.
Louco, definitivamente não. Esses são normalmente os que arriscam
ser agressivamente lúcidos.
Já andei armada em decoradora outra vez...
Um XI PA TI!!!
Hoje já não fico envergonhado, este é um autor conhecido e que até eu já li. Eu que até nem sou um grande beijoqueiro, li e citei excertos destes, há algum (muito) tempo atrás.
Abraço do Zé
"O beijo é anti-higiénico"
Director da ASAE
É por essas e por outras que nunca fui a Beja.
Um não beijo - um abraço
Meg,
Parece que houve por aí um comentário de mau gosto entre o da nossa amiga MPS e o meu, que já foi apagado. Gostava de ter visto.
Xi Grande
meg:o sá carneiro é referência para
qualquer poeta.
aproveito para convidar você e todos os amigos daqui a visitar a
www.palavoraz.com revista onde
tenho a coluna "matéria bruta".
um grande e fraternal abraço.
romério rômulo
Amigo Zé,
Então não gostas de conhecer gente nova a falar das noassas terras de uma forma tão bonita.
Eu também não conheço muitos deles, o que me vale é uma cegonha amiga que me traz estas prendinhas.
Prepara-te que vem mais.
Obrogada, Zé, pela visita e um abraço para ti
Amigo Pata Negra,
Os teus comentários são sempre muito esperados (não posso dizer porquê?).
Eles são uma lufada de ar fresco e humor.
Obrigada e um abraço
Querido Romério,
Fiquei feliz com a notícia e vou dar conhecimento a "todo o mundo"!
Hoje mesmo ainda vou-te mandar um mail.
Mas primeiro preciso ver a página, ontem já era muito tarde.
Um terno abraço
deixo-te o calor do meu beijo, neste belo post
Carla,
Ainda bem que gostaste.
Um abraço para ti também.
Gostei. Um belo retrato de Mário de Sá Carneiro. E vivam os insatisfeitos!
Um abraço anarquista
Amigo Savonarola
Isto de ser do contra os convencionalismos é que nos dá uma certa luta, não é?
Ainda bem que gostaste.
Um abraço
Cara Meg
Desculpe, mas agora deixou-me com uma dúvida: Sá-Carneiro não se suicidou a 26 de Abril? Posso, naturalmente, estar enganada!
Cara PV
Era um comentário estranho, provavelmente um vírus: alguém que, em várias línguas e texto estranho, recolhia fundos para as vítimas da PIDE/DGS!
Um abraço a ambas
Meg:
Este monólogo do beijo de Mário Sá Carneiro é fantástico, e sem comentários, só usufruir...
Beijo
Cara MPS,
Tem toda a razão.Pensei-me em Abril, imagine. Isto de se estar tanto tempo sem trabalhar...
Mário de Sá Carneiro suicidou-se efectivamente a 26 de Abril.
Agradeço ter chamado para o facto, pois irei proceder às referências que faço "à próxima semana".
O meu abraço amigo
Papoila,
É realmente muito bonito e também faz pensar.
Obrigada, e um abraço
Meg,
vim reler os BEIJOS de Mário Sá Carneiro e, lembrei-me entre tantos beijos aqui descritos, faltam os "beijos de Judas".
Olha, não sei porque me fui lembrar disto agora.
Beijos (fraternos)
Para um homem que não foi particularmente feliz trata o beijo de um modo muito preciso.
Muitas vezes almeja-se uma felicidade absoluta, que não existe pois afinal somos humanos. O fim trágico poupo-o a mais desilusões e sofrimento.
Cumps
Carminda,
Pois perguntas bem, mas não faço ideia, eu que não sou nada beijoqueira, como sabes, principalmente os de "sociedade". Prefiro um abraço,ou um bom aperto de mão.São muito mais reveladores da sinceridade.
Claro que há "os outros beijos", mas nesses não falo ahahahah!!!!
Um abraço
Caro Guardião,
Pessoas como Mário de Sá Carneiro não têm vida longa. Porque vivem a vida com uma intensidade e com uma voracidade tão grandes quanto as suas angústias. Lembras-te do filme "Os Inadaptados?).
E parece que Deus os chama antes de quaisquer outros...
Um abraço.
Mais um excelente post, com a qualidade a que já nos habituaste. Não conhecia este poema de Mário Sá Carneiro, mas gosto muito!obrigada por partilhares
um abraço
Meg
A minha vinda é para deixar abraço e beijinho Lisa
poderosa Meg!!
um beijão terno
PARADOXOS
Parabéns pela escolha... tb gosto imenso de MSC ... tudo mesmo beijinhos das nuvens
Anamarta,
Foi um prazer ver-te aqui e saber que gostaste.
As postas estão sempre abertas, mesmo que euvenha a não estar aqui por uns dias.
Um bom fim de semana e um abraço
Eduardo, muito obrigada por aquele "poderosa"! Espero que não seja o último!
Julgo que é uma estreia aqui, e ainda hoje irei visitar o seu espaço.
Bom fim de semana
Um abraço
F@, muito obrigada.
Fico feliz por ser uma admiradora do Mário de Sá Carneiro.
Irei retribuir a visita, logo que possível.
Bom fim de semana e um abraço
Desde que li o "baloiço" de Mário de Sá Carneiro, passei a incomodar-me com personalidade tão depressiva. Mas gostei deste poema...
Jasmim,
Tão depressiva e tão atormentada, que o levou a uma morte tão prematura.
Honremos pelo menos a obra que nos deixou. Obrigada, Jasmim!
Um abraço
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